BENVINDA(O) A ESCOLA PSICANALÍTICA DA ESCUTA PERIPHÉRICA
Por uma Escola Psicanalítica como insurgência, não como favor
Graciliano Ramos, com Baleia, não narrou só a seca. Mostrou o abandono brutal de quem insiste em viver na margem. Baleia sonhava – foi morta. Porque neste mundo, o sonho dos vulneráveis incomoda. A lógica que mata é a mesma que rege o capital: tudo vira produto, até o desejo. Freud já sabia ao dizer: a cultura reprime o sujeito. Mas também apontou que mudar as relações de propriedade poderia aliviar o mal-estar. Hoje, essa repressão se aprofundou. O valor de uma vida é medido pelo que ela consome.
No Brasil, pobreza é mais do que falta de renda – é exclusão existencial. Pretos, jovens, periféricos são os que mais carregam esse peso. E chamar isso de “falta de acesso” é pouco. “Preço social” é só o mercado com desconto. Democratizar, aqui, é reparar.
Escolas tradicionais de Psicanálise seguem operando sob a lógica do capital: pobre como pedinte, terapeuta como autoridade, formação como produto. A Escola Psicanalítica da Escuta Periphérica rompe com esse modelo. Aqui, ninguém paga como concessão, mas como gesto de equidade. Ninguém é medido pelo que tem, mas reconhecido por quem é. É a lógica da horizontalidade lá onde o capitalismo exige hierarquias.
Essa escola não busca incluir pra normatizar. Busca escutar, abrir espaço e ser atravessada pelo que é diferente. Por isso, mais de 51% da nossa composição é preta, com presença crescente de LGBTs e corpos periféricos. Formar psicanalistas é escutar também o social, o político, o histórico. Não existe sintoma fora do mundo. E nossa Escola não quer adaptar a psicanálise ao mercado, mas libertá-la dele.
A Escola Psicanalítica da Escuta Periphérica é presença, insurgência e memória. Um lugar onde o cuidado não é mercadoria, e a transformação não é retórica. É por isso que criamos o projeto #TamuJuntu. Aqui, toda contribuição tem o mesmo valor: manter vivo esse sonho coletivo. Entre na ciranda, faça parte deste movimento.

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INAUGURAÇÃO DA ESCOLA 14 de Março de 2025
A Escola Psicanalítica da Escuta Periphérica nasce da necessidade de uma psicanálise comprometida com a realidade dos corpos racializados, periféricos e subalternizados pelo colonialismo, pelo racismo estrutural e pela necropolítica. Entendemos que a formação em psicanálise não pode estar desvinculada das condições materiais e históricas que atravessam os sujeitos.
É com esse compromisso que temos o prazer de convidá-lo para assistir a inauguração virtual da Escola no site http://www.escutaperipherica.org , um espaço que se propõe a ser um campo contínuo de aprendizado gratuito, pesquisa e prática clínica, onde a psicanálise não se mantém neutra diante das violências estruturais, mas se insurge como recurso de resistência e reinvenção subjetiva.
Evento de Inauguração
📅 Data: 14 de março de 2025
🕙 Horário: 19h às 21h
📍 Assista o vídeo da Inauguração acima
🎤 Abertura com o Psicanalista Érico Andrade (UFPE)
Prof. Dr. Érico Andrade Psicanalista, filósofo com doutorado na Sorbonne, professor de Filosofia da UPFE e pesquisa temas ligados à identidade, sofrimento e racismo com bolsa de produtividade em pesquisa pelo CNPq. É autor de Negritude sem Identidade. Compõe o coletivo Pontes da Psicanálise.
Nosso Projeto de Formação Permanente se estrutura a partir de três eixos fundamentais: teoria, clínica e política, pois compreendemos que a formação do psicanalista periférico exige um compromisso simultâneo com a escuta, a produção de conhecimento e a transformação social. Nossa proposta é de uma formação viva, rizomática e situada, que parta da experiência dos sujeitos negros, indígenas, LGBTQIAPN+ e das margens da sociedade.
O QUE É Escuta Periphérica?

O conceito de Psicanalista Periphérico está em um contexto de interseção entre os campos da subjetividade, política e cultura. Ao reconhecer as exclusões que comparecem na clínica impostas pelos embaixadores da tríade opressivas: racismo, misoginia e capitalismo*, não se limita a uma prática clínica clássica. Munido de uma escuta anticolonial e herética, o psicanalista periphérico não é apenas aquele que clinica nas margens geográficas da sociedade, mas agencia afetos e subjetividades centralizando vozes historicamente marginalizadas pelo inconsciente.
As subjetividades periféricas são moldadas pelas exclusões sistemáticas impostas pelos embaixadores da tríade opressora. Esse mecanismo opera como uma engrenagem de forclusão, apagando experiências que não se ajustam aos moldes hegemônicos de poder e pertencimento. Por isso, o psicanalista periphérico atende as margens como um sinthoma social, um barramento feito de resistências contra as estruturas de poder que silenciam potências e homogeneízam subjetividades dissidentes.
A prática do psicanalista periphérico rompe com as hierarquias simbólicas e epistemológicas impostas pela branquitude e pelo conservadorismo. Ela se volta para os aspectos pulsionais e alienados do desejo na direção dos novos modos de gozo. Esses modos desafiam as normas impostas pelo Outro Colonial. Expõe e denuncia os mecanismos de repetição transferencial da colonialidade e da necropolítica pulsional, retirando-os das sombras e revelando sua função na perpetuação das violências e da exaustão nos corpos dissidentes.
A posição ética e política do psicanalista periphérico não apenas escuta, mas age politicamente ao criar aberturas de fala e escuta para aqueles que historicamente foram silenciados. Ele opera na linha do desejo ativista, entre a clínica e a militância, reconhecendo que o inconsciente também é atravessado por dinâmicas de exclusão e resistência.
* Leila Gonzalez e Jacques Lacan
“Há mais de duas décadas, quando pisei nos primeiros seminários de formação psicanalítica, Virgínia Bicudo era um nome fantasma — um silêncio cúmplice que atravessava as salas, os textos, os debates. Nenhuma menção, nenhuma citação. O mesmo destino teve Édipo Africano, de Marie-Cécile e Edmond Ortigues, cuja edição brasileira de 1989 permanece um espectro ignorado até pelos ditos progressistas. Enquanto isso, James Joyce era tratado como pedra angular. Rompi. Assumi minha negritude e minha perificidade, e tomei o enunciado de Riobaldo: “quem conhece sertão é urubu”. A psicanálise que eu queria não poderia vir de outro lugar, psicanálise de margem nasce na margem — dos corpos que nela vivem, das dores que nela ecoam. Pois, como Audre Lorde já advertia, “as ferramentas do mestre não destroem a casa do mestre”. Meu primeiro atendimento nesse território confirmou o caminho: uma mulher preta e periférica me disse: “finalmente um lugar onde eu posso falar de macumba”. Foi ali que nasceu a ideia de uma Escola Psicanalítica da Escuta Periphérica, um espaço para que outros psicanalistas das margens pudessem se achegar. Porque se o inconsciente é político, o desejo é ativista.”
“Olha, se alguém me dissesse há uns 15 anos que eu ia estar aqui falando sobre a fundação da Escola Psicanalítica da Escuta Periférica, eu teria dado risada. Porque o caminho até aqui foi tudo, menos linear. Naquela época encontrei Jairo Carioca e a verdade é que a psicanálise sempre nos fascinou, mas, ao mesmo tempo, sempre nos incomodou. Fui clinicar na periferia porque era onde eu morava. Não foi uma escolha teórica, foi uma escolha de realidade. Só que não foi fácil. Quando começamos a falar de escuta periférica, teve muita resistência. Escutamos de tudo: que isso não era psicanálise, que a gente estava deturpando Freud, que era militância disfarçada de clínica. Mas a gente insistiu. Porque sabíamos que não estávamos inventando nada. Foi um processo longo, feito de muitas conversas, muitas brigas, muitas desistências e retornos. A gente não queria só criar um espaço de formação, queria criar um espaço de transformação. Onde a psicanálise pudesse ser ferramenta de luta, mas sem perder sua essência. Onde a gente pudesse pensar a subjetividade sem ignorar a materialidade. Onde o inconsciente não fosse tratado como uma entidade flutuante, mas como algo atravessado por raça, classe, gênero, território.”
“Nos últimos anos venho sonhando com o momento de encontrar uma Escola onde qualquer pessoa, em seu percurso de uma análise, ao se deparar com o desejo do analista, pudesse, sem restrições realizar o seu percurso permanente independente de todos os seus atravessamentos psíquicos, sociais e econômicos. Sonhei um dia viver o momento de estar em um espaço qualificado, acolhedor e participativo onde a psicanálise fizesse sinthoma! É por isto que aqui chegamos! Isto não seria possível sem o trabalho incansável destes dois psicanalistas periphéricos: Jairo Carioca e Ronald Lopes. Suas produções acadêmicas vão ficar para a história da psicanálise à brasileira.”